domingo, 3 de abril de 2011

Quando chegares, avisa (se é que já não chegaste).


É fácil saber se um amor é o primeiro amor ou não. Se admite que possa ser o primeiro, é porque não é, o primeiro amor só pode parecer o último amor. É o único amor, o máximo amor, o irrepetível e incrível e antes morrer que ter outro amor. Não há outro amor. O primeiro amor ocupa o amor todo. Nunca se percebe bem por que razão começa. Mas começa. E acaba sempre mal só porque acaba. Todos os dias parece estar mesmo a começar porque as coisas vão bem, e o coração anda alto. E todos os dias parece que vai acabar porque as coisas vão mal e o coração anda em baixo. O primeiro amor dá demasiadas alegrias, mais do que a alma foi concebida para suportar. É por isso que a alegria dói - porque parece que vai acabar de repente. E o primeiro amor dói sempre de mais, sempre muito mais do que aguenta e encaixa o peito humano, porque a todo o momento se sente que acabou de acabar de repente. O primeiro amor não deixa de parte um único bocadinho de nós. Nenhuma inteligência ou atenção se consegue guardar para observá-lo. Fica tudo ocupado. O primeiro amor ocupa tudo. É inobservável. É difícil sequer reflectir sobre ele. O primeiro amor leva tudo e não deixa nada. Diz-se que não há amor como o primeiro e é verdade. Há amores maiores, amores melhores, amores mais bem pensados e apaixonadamente vividos. Há amores mais duradouros. Quase todos. Mas não há amor como o primeiro. É o único que estraga o coração e que o deixa estragado. É como uma criança que põe os dedos dentro de uma tomada eléctrica. É esse o choque, a surpresa "Meu Deus! Como pode ser!" do primeiro amor.
Os outros amores poderão ser mais úteis, até mais bonitos, mas são como ligar electrodomésticos à corrente. Este amor mói-nos o juízo como a Moulinex mói café. Aquele amor deixa-nos cozidos por dentro e com suores frios por fora, tal e qual um micro-ondas. Mas o "Zing!" inicial, o tremor perigoso que se nos enfia por baixo das unhas e dá quatro mil voltas ao corpo, naquele micro-segundo de electricidade que nos calhou, só acontece no primeiro amor. (...) Electrifica-nos a capacidade de poder amar. Ardem-nos as órbitas dos olhos, do impensável calor de podermos ser amados. Atiramo-nos ao nosso primeiro amor sem pensar onde vamos cair ou de onde saltámos. Saltamos e caímos. (...) O primeiro amor está para além das categorias normais da dor e do prazer. Não faz sentido sequer. Não tem nada a ver com vida. Pertence a um mundo que só tem duas cores - o preto-preto feito de todos os tons pretos do planeta e o branco-branco feito de todas as cores do arco-íris, todas a correr umas para as outras. (...) Não há regras para gerir o primeiro amor. Se fosse possível ser gerido, ser previsto, ser agendado, ser cuidado, não seria o primeiro. A única regra é: Não pensar, não resistir, não duvidar. Como acontece em todas as tragédias, o primeiro amor sofre-se principalmente por não continuar. (...) Mas é por ser tão insustentável e irrepetível que o primeiro amor não se esquece. Parece impossível porque foi. Não deu nada do que se quis. Não levou a parte nenhuma. O primeiro amor deveria ser o primeiro a esquecer-se, mas toda a gente sabe, durante o primeiro amor ou depois, que é sempre o último.

, CARDOSO, Miguel Esteves.

16 comentários:

  1. O primeiro amor é assim, porque é genuíno, porque "quando o amor se revela, não se sabe revelar". : )

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  2. sabe-se quando acontece do nada, quando olhas para aquela pessoa e pensas eu nao me imagino a sentir algo por ela não passamos de amigos apenas. e é que acontece com o tempo, vão vivendo , ela vai entrando-te surrateiramente, demoras a dizer o que sentes por ela, mas no fim o que sentes por ela é algo que te deixa caída.

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  3. muito obrigada :)
    também gosto deste excerto*

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  4. "O primeiro amor deveria ser o primeiro a esquecer-se, mas toda a gente sabe, durante o primeiro amor ou depois, que é sempre o último." - tão perfeito.
    amei

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  5. olha dás-me o teu mail ? $:
    tenho a certeza, que as tuas palavras me vão ajudar.
    dás? $:

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  6. eu já tive e de certa forma ainda permanece em mim. um amor assim não se esquece com um estalar dos dedos. quanto a ele? não sei, seguimos caminhos diferentes nunca mais me cruzei com ele. e foi o melhor (:

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  7. há varias pessoas que me marcaram e apesar de ele nem ter marcado tão intensamente o que marcou mesmo foi o tempo que estivemos juntos são bastantes memórias para se apagar.

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  8. eu nestas coisas sou muito fria, prefiro deixar cá dentro a demonstrar que ainda sinto algo. nunca mais lhe dirigi a palavra sequer e tenho a mentalidade de sempre para a frente porque em frente é o caminho sem duvida e no futuro seremos mais felizes do que outrora fomos :D

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  9. aliás temos o nosso chão: amigos e familia, esses nunca nos abandonarão :)

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  10. claro que sim :) e não devemos desistir muito pelo contrário temos de ser fortes e alcançar a felicidade, lutando pelos nossos objectivos :D

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  11. não é um amor que nos faz deixar de os ter, antes de ele entrar nas nossas vidas já tinhamos uma vida e nela existiam objectivos. e se esse amor acabou então temos de continuar com esses objectivos porque apenas dependemos de nós para os concretizar :)

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  12. Tem graça, mas acho que nunca a cantei por aí.

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